14 agosto 2006

Procura incessante...



Olho ao redor.
Deparo-me com o imenso vazio que é a minha mente. Nesse [mesmo] vazio, procuro incansavelmente.
"O quê?", pergunto-me
“Mas o que procuro?”. Sei a resposta. Mas preciso de a dizer (para interiorizar, para admitir).
Sussurro-a. Não é o suficiente.
Volto a sussurrar, continua a não ser suficiente.
Falo-a. Continua a ser insuficiente.
Grito-a. Já se ouve um murmúrio lá bem no fundo. Respiro fundo.
Grito-a ainda mais alto. Percebem-se algumas palavras, mas não o suficiente para me fazer entender. Inspiro profundamente, novamente.
GRITO. É o suficiente.
Já me fiz ouvir.
Mas afinal, pergunto a mim mesma, quero-me fazer ouvir para quem? Ninguém está na audiência a assistir.
Estou sozinha no imenso vazio que me envolve. Sempre estive. Sempre envolveu.
Fecho os olhos e concentro-me; espreito para a audiência, com os olhos entreabertos.
Continuo sozinha. Volto a fechá-los, mas desta vez, por completo.
Espero. “Ainda não”, sussurrou-me uma voz calma e doce ao ouvido. Era uma voz estranha, mas ao mesmo tempo familiar; dava a impressão de que me conhecia profundamente, como ninguém.
Continuo a esperar. “Só mais um bocadinho”, tornou a voz a dizer-me. A espera torna-se longa. Fico impaciente. Estou cansada. “Já podes abrir
Abro os olhos. Algo mudou. Tenho audiência. Volto a gritar. Desta vez faz sentido. Após o grito, começo a sentir a mudança a surgir no meu íntimo. Apercebo-me de que a audiência era eu mesma; era eu que estava fechada dentro de mim e que ainda não tinha acordado para a minha realidade, para o que realmente sou, para o que sempre senti…
Doía ter de admitir o que sentia, por isso, prendi o grito cá dentro, numa imensa agonia. Não fui capaz. Não o consegui conter mais. Soltei-o.
Agora, consigo dizer para mim mesma o que sinto. Consigo sobretudo entender. Mas ainda não a consegui admitir por completo.
Elaboro um plano para poder admitir a resposta gritada. Penso nos utensílios necessários. “Mas quais serão?”, pergunto-me. Acalmo-me. Sento-me num tronco, envolta em brumas. As brumas não me invadiram o pensamento desta vez. Consigo pensar. Penso. Já sei. Enumero num pergaminho o que necessito: calma, coragem, determinação, sinceridade. “Faltará algo?”, “Sim”, retornou a voz. “Mas o quê?”, pergunto-lhe. “Falta o sentimento”, “Mas que sentimento?”, “Aquele que estava na audiência, aquele que te fez chegar até aqui, que te fez quebrar barreiras, o que te retirou da tua concha, o que te trouxe de volta para a vida, o que foi mais forte que tu mesma e te fez soltar o grito, aquele que te mostrou o verdadeiro sentido da existência e, acima de tudo, da tua própria vida! Aquele que te mostrou porque tudo vale a pena, desde as mais pequenas coisas até às maiores loucuras…”, “Mas que sentimento é esse?”, “Ainda não o denominaste?”, “Não”, digo hesitante. “Então, como o queres admitir? Porque te escondes da resposta?”, “Porque é como uma pequena ferida profunda que custa a sarar. E cada vez que a procuro, para a poder curar, dói, dói imensamente”, “Tens a certeza?”, “Penso que sim, pois já percorri o mundo, já vasculhei todos os recantos, até os do meu ser, e nada; não consigo encontrar uma palavra que consiga expressar o que sinto. Sabes qual é?”, “Claro”, “Então porque não ma dizes?”, “Terás de ser tu a encontrá-la. Tens tudo o que necessitas para a encontrares”.
Dito isto, a voz partiu. Abandonou-me, deixou-me à deriva e entregue, novamente, a esta demanda.
Sei o que tenho a fazer.
Parto, mais uma vez, à procura da tal palavra mistério. Percorri montanhas, rios, mares, planícies, desertos, contactei com todo o tipo de culturas, e cada vez que perguntava a alguém qual era a tal palavra, sempre na esperança de a encontrar. Todos se riam. Eu pensava: serei tão ignorante, tão insensível ao ponto de não saber a palavra?
Já cansada, regresso a casa.
Ao chegar, um sentimento de desespero invade a minha alma, por não ter conseguido encontrar a palavra, a chave para o que sinto. Sinto-me novamente só. Não como antes, pior ainda. Saio à rua e sento-me em frente ao mar.
Choro incessantemente.
Penso. Penso naquela pessoa. Aquela que, tal como a voz me havia lembrado, me havia acordado, aquela que me tinha tirado da minha concha, aquela que me faz sentir coisas inexplicáveis por palavras, coisas antes inimagináveis para mim, aquela que adoro ter a meu lado [seja em que momento for], e que quando não tenho, fico numa agonia imensa, numa ansiedade tremenda, à espera do momento em que a irei reencontrar. E quando a reencontro, sinto que voltei a viver; sinto que tudo à minha volta desaparece mas ao mesmo tempo, faz sentido, como nunca antes havia feito.
Olho o mar. Noto a sua transparência, o seu movimento calmo e sossegado…parece que responde às minhas dúvidas; parece que ele sim, guarda a resposta da minha demanda.
O sol começa a recolher-se. Fecho os olhos, para sentir o anoitecer de uma vida, e o nascer de outra.
Nesse momento, compreendo finalmente o sentimento que surgiu e permanecia, até então, dentro de mim.
A tal resposta, a tal palavra-chave surge. Fico feliz.
Grito-a bem alto para a imensidão do mar. Finalmente compreendo-me.
O pôr-do-sol invade o horizonte, assim como um sentimento de alívio invade a minha mente.
Continuo com os olhos fechados.
A voz aparece e pergunta: “Então? Foi difícil?” "Não", respondo. Apercebo-me que a voz era simplesmente a minha mente a falar comigo. Era a outra parte de mim que sabia exactamente o que se passava comigo, a tentar acordar a outra metade.
Sinto alguém a aproximar-se. De repente, sinto alguém a envolver-me nos seus braços, num abraço forte e acolhedor. Sinto-me protegida.
Começo a sentir o toque suave das suas mãos, o toque dos seis lábios sobre o meu corpo. Neste preciso momento, sussurrou a palavra que tanto procurei ao meu ouvido. Reconheço a voz: és tu que estas ao pé de mim.
Abro rapidamente os olhos.
Olho para todos os lados.
Não estás lá…
Afinal, tudo não passava de uma miragem, de um sonho…
Acordo sobressaltada...

1 comentário:

Anónimo disse...

Raio das vozes. Sempre a refilar, a indicar caminhos, a dar sugestões. Porque não nos deixam sozinhos um instante a descansar, a chorar? Era tão mais fácil... Still. O caminho é para a frente. E tem de ser percorrido. Doa ou não.

Que mal tem ser um sonho? "O sonho comanda a vida"